A leitura do manifesto pró-Líbano com que Tariq Ali abriu sua conferência hoje na Flip acabou por dominar o debate até o fim – como estava previsto. Nenhuma das perguntas encaminhada ao escritor pela platéia teve como tema qualquer questão ligada à literatura. E a verdade é que não fez falta. Melhor ensaísta e debatedor do que ficcionista, Ali protagonizou uma mesa vibrante, marcada aqui por aplausos de pé, ali por vaias, num clima de happening que esquentou – muito – a temperatura do balneário.
Tariq Ali começou falando das relações entre literatura e política, que são profundas – uma verdade inegável. “Não há uma muralha da China separando literatura e política”, afirmou, citando autores previsíveis como Stendhal entre aqueles cuja obra tem motivação política e outros surpreendentes – como Proust – entre os que, mesmo sem essa intenção, produziram livros que admitem uma leitura política.
Para provar que toda literatura tem algo de político – e também que não é “anti-americano”, um rótulo que diz odiar -, Ali elogiou o autor Cormac McCarthy, dizendo que seu Blood Meridian é “uma descrição perfeita da brutalidade do Império”. Aproveitou para emendar num elogio efusivo de “Cidade de Deus”, de Paulo Lins, qualificando-o de “romance que finalmente rompeu com a imitação dos pontos altos do realismo mágico latino-americano”. Talvez Ali precise ler mais autores latino-americanos.
De todo modo, como ninguém que valha a pena defende a absoluta incomunicabilidade entre literatura e política – embora alguns critiquem os trabalhos em que esta se sobrepõe àquela – o preâmbulo soou meio vazio. E, como se quisesse desmentir o ponto de partida do discurso de Ali, daí em diante a literatura foi dar uma volta no cais de Parati e deixou a Tenda dos Autores, pela primeira vez este ano lotada até a última cadeira, entregue apenas aos temas políticos.
É o ponto forte de Tariq Ali, sem a menor dúvida. Ele fala bem, sem hesitações, cita fatos de memória e conta boas piadas com a cara mais séria do mundo – deadpan é o nome técnico em inglês, algo como “cara-de-pau”. Funciona. Quem estiver interessado nos detalhes dessa parte da palestra, porém, deve procurar outras fontes. Aqui vou registrar apenas os dois momentos em que Ali foi empurrado para fora dos limites de seu discurso habitual contra o imperialismo americano, já bastante conhecido.
Quando lhe perguntaram o que acha da revista “Veja”, que esta semana lhe dedicou um artigo de rara agressividade, revidou e ganhou gargalhadas e palmas: “A ‘Veja’ imita a ‘Time’ e a ‘Newsweek’, mas não é tão boa quanto a ‘Time’ e a ‘Newsweek’. E isso, para mim, é dizer muito”. Em seguida, quando lhe perguntaram se reconhece o direito de Israel existir, ganhou vaias de parte do público – e aplausos de outra parte – quando disse que sim, reconhece, mas acrescentou: “Se Israel continuar a se comportar assim, não vai existir mais no final do século. Não porque será varrido do mapa, mas porque vai implodir”.
8 Comentários
Concordo com as duas afirmações que ele fez, constantes do final desse texto.
Tarik Ali tem um livro altamente esclarecedor sobre a questão palestina, Israel, a Guerra do Iraque, a expansão americana no Oriente Médio. Trata-se de “Imperialismo e Resistência”, editado pela editora Expressão Popular, a editora do MST.
Recomendo a prazerosa leitura a todos.
Isso acontece com muita freqüência… O Saramago, muito mais escritor do que o caso em pauta, raramente fala de literatura. Quem assiste as entrevistas dele pode pensar que ele é tudo: sociólogo, analista político, político mesmo, etc… menos escritor.
Agora o que disse da Veja é muito pertinente…rs.
Tariq Ali é um dos últimos resquícios de uma intelectualidade post-estalinista que ainda sobrevive em certos meios da esquerda. Note-se que se trata da “esquerda” radical, aquela de quem dizia Doriat, que era a sementeira dos nazistas. Em língua inglesa, liga-se ao grupo da “New Left Review”, que é dos últimos baluartes do espírito totalitário, hoje completamente ultrapassada por publicações como “The Nation”, esta sim uma revista de esquerda racional e democrática. É de seu espírito o insulto contra publicações de circulação maciça (“Time”, “Newsweek”, “Veja”), pelo mero fato de que sua linha editorial não se encontra na mesma linha de seu radicalismo. É como quem inventa inimigos fantásticos para ter contra quem lutar. E nós, idiotas latinoamericanos, batemos palma… Uma de suas principais características é esconder-se atrás de jogos de palavras: não é “anti-americano” mas sim “anti-imperialista”, embora todos os americanos acabem, em dado momento, por ser imperialistas; não é “anti-semita” mas sim “anti-sionista”, etc. O triste para o Brasil é que, já no século XXI, “a mais concorrida mesa da FLIP” ainda seja a deste “intelectual”…
Concordo plenamente com o Pedro Curiango. Além de tudo isso é bom lembrar que os rótulos estão todos mal colocados: escritor não é sinónimo de “intelectual”, a maioria é ignorante, esquerdista não é mais sinònimo de progressista, é puro atraso, em todos os sentidos, e nunca foi de democrático, os países onde a esquerda foi oficial eram totalitários . Na realidade o único pais onde se pratica o socialismo, sem prejuízo de outras formas de vida, onde há liberdade de opinião, onde há democracia e onde há serviços decentes do estado e ao mesmo tempo ninguém impede que v. ponha seu negócio, seja empregado ou viva o cooperativismo é Israel.
Como é lindo defender terrorista ! Eu e to-
das as pessoas que aqui comentaram, ou não, que só visitaram o site ou não,somos
todos INFIÉIS para o ”Islã”! Todos eles,tal
o ”escritor” paquistanês, podem vir viver
aqui ou em qualquer lugar da terra! Quem
se habilita a abrir uma igreja cristã no Irã ?
É civilizado, é humano oferecer ”x” cavalos
por um ser humano MULHER!Para dizer No
Mínimo.
Disse tudo: o livro do inDUHvíduo foi editado pelo MST…
TARIK ALI NA
“CARTA MAIOR”
http://cartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=11981