“Se estamos vendo um declínio nos padrões de letramento infantil, isso se dá apesar das mensagens de texto e não por causa delas”, afirma a psicóloga Clare Wood, da Universidade de Coventry, na Inglaterra, que conduziu nos últimos dez anos um estudo sobre o assunto com crianças de 8 a 12 anos.
A conclusão de Wood (em inglês, acesso gratuito) aponta para o oposto daquilo que, nos últimos tempos, vem deixando pais e professores à beira de um colapso nervoso: não só a famigerada “linguagem” cheia de abreviações do MSN e dos torpedos não faz mal nenhum como, ora veja, faz bem! O estudo constatou que quem tc msg no cel o dia todo, entre abrax e bjusss, tem maior capacidade de escrita e leitura do que quem não faz isso.
A revelação pode ser contraintuitiva, mas sou obrigado a dizer, com humildade, que não me surpreende nem um pouco. Há cerca de uma década, costumo tranquilizar leitores alarmados dizendo que, filosoficamente, não há diferença entre a notação cifrada da cultura virtual e a velha Língua do Pê. Em ambos os casos, trata-se de brincar com a língua, o que é uma forma de tomar posse dela, e criar um patoá que, como as gírias em geral, cumpre a função de reforçar a identidade de um grupo.
Decorre daí que a reação apocalíptica dos que se julgam zeladores da língua formal também é compreensível, mas apenas como parte de um jogo de cartas marcadas. Como diz o historiador Peter Burke, estudioso da história das gírias, “enquanto muitos grupos de pessoas definem sua identidade por meio do uso de jargão, um grupo, o dos críticos, define a sua por meio da rejeição do jargão dos outros”.
Ah, mas com o tempo os pequenos bárbaros digitais vão acabar esquecendo que msg é “mensagem” e transformando a ortografia em bagunça? Duvido muito, mas, se mudanças do gênero vierem a ocorrer, convém lembrar que a ortografia é apenas o verniz da língua, uma roupa que as palavras vestem e abandonam conforme os ditames do tempo. Gravata já foi gorovata em bom português, e nossa civilização não se tornou ágrafa quando deixou de ser.
Aqueles que, como eu, foram criados vendo televisão desde pequenos sabem o que é um verdadeiro ambiente hostil à cultura escrita. Esta, depois de mais de meio século perdendo a guerra, tem na internet (etc.) uma poderosa e inesperada aliada.
18 Comentários
É cada uma que aparece…
Acredito que a internet seja um gatilho para o interesse repentino pela leitura de consumo rápido ou instantânea. Há virtudes e problemas aí. Os símbolos não são fim em si mesmos, querem dizer alguma coisa, então, cumprem seu papel. Contudo, pensamentos mais aprofundados, percepções mais detalhadas de fenômenos, apreensões de informações, tudo isso fica comprometido. Afinal, a ordem do dia é “esvaziar” a mente sempre, para encher cada vez mais!
Vejo com preocupação a juventude de hoje, não pela amor ao novo, mas pelo excesso. Crianças chegam a passar 12 horas na frente de um computador teclando bobagens vazias, apenas pelo prazer (?!) de ‘escrever’.
Há confusão quando se tenta justificar a infiltração dessa novidade no vernáculo, comparando com as regressões, aglutinações, entre outras transformações que ocorreram ao longo dos anos na língua portuguesa.
A ideia da língua como verniz é belíssima, mas devemos ter cuidado. As regras gramaticais, a utilização correta da língua, tanto em discurso, quanto em uma redação, dizem muito sobre a história cultural de um povo. Parte de nossa identidade está ali!
O que se pretende com esse dialeto praticado nas redes sociais é assassinar a língua portuguesa tradicional, fazê-la desaparecer. E a maior razão disso está na dificuldade (desinteresse) dos jovens em apreender conteúdos, pois vivem em um mundo onde tudo é volátil. A maior prova disso é estatística. Somos 70% de analfabetos funcionais!
Lendo esse artigo fico a imaginar: se os profissionais de hoje (advogados, médicos, engenheiros, etc.), que iniciaram seus estudos antes da era dos MSN e dos torpedos, já não são muito íntimos do uso correto da língua, quero ver uma petição feita por um advogado que vai se formar daqui uns dez anos! Naum sei naum!
Eu estou achando o máximo, seja como for , está havendo diálogo, as pessoas estão se correspondendo.
Discordo plenamente da citada pesquisa, pois o que vejo por aí, são pessoas escrevendo de forma errada, uma vez que a escrita é hábito, é repetição e com o tempo as pessoas passam a ter dúvidas se casa se escreve kaza, caza, ou kza. Noto isso no dia-a-dia de minha família.
EU ACREDITO QUE É MUITO IMPORTANTE ESCREVER DA MELHOR MANEIRA POSSIVEL SE PUDER,CASO CONTRÁRIO A PESSOA,DEVE FAZER UM RESUMO DO QUE DESEJA EXPRESSAR,POIS O ÍNDICE DE ANALFABETO FUNCIONAL AINDA É IMENSO,PARA CHEGAR A ESSE ESTÁGIO DE ESTABELECER UMA RELAÇÃO NÃO FORMAL COM A LINGUA.
“…A ortografia é apenas o verniz da língua, uma roupa que as palavras vestem e abandonam conforme os ditames do tempo”.
Não sei por quê, mas nunca havia pensado dessa maneira. E faz todo o sentido.
Creio que a linguagem na net,nada mais é que uma manifestação cultural,já q,estamos na era da internet,portanto não há nenhum mal nisso.
Se agente comparar uma redação de um adolescente de agora e de um adolescente da mesma idade a uns 15 anos atras agente percebe a diferença… Muitas vezes por falta de atenção ou por esta acostumado a escrever errado sempre escreve do mesmo jeito. Seria bom se todos tivessem a consciencia do problema maais……
Adorei! Vamos nos deixar surpreender pelos novos tempos!
a lingua portuguesa é tão bela é triste vê-la corrompida desta forma. A escrita caracteristica do msn e dos torpedos não é mostra da incapacidade dos jovens de lidarem com seu idioma, é sim preguiça e falta de habilidade para digitar rapidamente suas palavras.
Isso porque o PT quer que o “Esperanto” seja uma língua obrigatória a ser estudada nas escolas… Vejam que mistura: esperanto+ linguagem cibernética + analfabetismo funcional na Língua Portuguesa… LINDO!
Eu concordo com isso, sempre achei. A maior parte do que eu aprendi sobre escrita foi por aqui, vi muita gente melhorar também. E há vários motivos para isso. Por exemplo, como toda a comunicação é feita através da escrita, com ferramentas como o “twitter” que qualquer um pode ver e tal, as pessoas passam até a se preocupar mais em não fazer “besteira”, vejo o meu irmão de 13 anos fazer isso (no momento, ele não escreve bem, comete erros graves, tem até dificuldade, mas aposto que dentro de algum tempo vai melhorar).
O Isaias falou das dúvidas, mas já há diferença, há dúvida. Quando é que alguém ia parar pra pensar como se escreve casa? E o google vai responder rápido, com diversas explicações. Sem falar que o maior número de coisas que as pessoas acabam lendo faz com que veja mais vezes o modo certo de escrever. Há muito errado, mas mais ainda certo.
E quem usa há mais tempo, participa de redes sociais e tudo mais, acaba entrando numa espécie de “moda”, como se escrever bem fosse status. Vejo muito isso.
O Silvio falando… como você mesmo disse aqui, a nossa língua portuguesa já é a língua portuguesa corrompida de algo do passado. Tudo bem que não precisa ser exagerado, mas a maior diferença mesmo é que as pessoas estão escrevendo, mostrando, antes isso não acontecia. E dizer que é preguiça e falta de habilidade é generalizar. Mensagem às vezes tem limite, quem é que vai pagar mais só pra escrever algo certinho? Além dos outros limites, como o do próprio twitter.
Todo mundo fala do imediatismo da “era da internet”, mas aprendizado e construção se faz com o tempo. Tenho ainda salvo meu “flogão” de quando tinha 12 anos, o que está escrito lá é uma tristeza, mas agora, 6 anos depois, a diferença é impressionante.
Aposto que qualquer pessoa usando a internet durante 5 anos vai ter uma melhora na escrita. Essa confusão inicial é medo do desconhecido, conservadorismo, desespero exagerado ou/e o fato de não conseguir ver mais adiante. É tudo muito novo.
– Só pra constar, é claro que qualquer um realmente preguiçoso, que não se interessa e nem se importa não vai melhorar tanto, às vezes até piorar. A questão é: ele ia se importar se tivesse ou não internet? Ia escrever errado de qualquer jeito, há muita palavra que causa dúvida. Na verdade, nem ia escrever.
kkkkk, Vai ser difícil de escrever assim, pois foi complicado pra ler…
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Uhu! Creio que a questão é mais complexa… e estudos sobre procedimentos e conscientização sobre o processo de leitura também ajudam a explicar e esclarecer um pouco esse assunto – e nem cabe aqui ‘dissertações’, não é esse o propósito, senão suscitar mais reflexões. Assim, segue abaixo um exemplo de exercício usado para conscientizar alunos de que não lemos palavra por palavra nem em língua materna nem em língua estrangeira:
O nosso cérebro é doido!!!
De aorcdo com uma peqsiusa
de uma uinrvesriddae ignlsea,
não ipomtra em qaul odrem as
Lteras de uma plravaa etãso,
a úncia csioa iprotmatne é que
a piremria e útmlia Lteras etejasm no lgaur crteo. O rseto pdoe ser uma bçguana ttaol, que vcoê anida pdoe ler sem pobrlmea.
Itso é poqrue nós não lmeos
cdaa Lreta isladoa, mas a plaarva
cmoo um tdoo.
Sohw de bloa.
Verifique como a troca de letras não dificulta a compreensão.
Uma coisa sempre me espanta nesses assuntos. Por que será que esses senhores, especialistas no tema, sempre nos aparecem com a conclusão de que quem escreve abrxx, bjus, e o mais, são uma espécie de gênios “disfarçados”, verdadeiros tesouros do vernáculo, apenas que indolentes ou desleixados. E quem não “consegue” escrever assim, são uns burros, recalcados, de uma imbecilidade anacrônica etc. Tenho uma vontade danada de discutir sobre o assunto com esses senhores (as); ou melhor, discutir, não. Apenas lhes dizer que são uns idiotas, com teorias bestas em cujas bases se repetem: fazem dos tolos, os espertos, e os verdadeiramentos espertos, são tidos como os tolos. É certo que a imensa maioria dos que se expressam através do internetês, são e serão estatísticas da massa dos analfabetos funcionais. Essas pobres criaturas, são as mesmas que, ao se depararem com um trecho de Machado de Assis, por exemplo, nada compreendem e até empregando algum esforço. Dir-se-ia um texto em grego. Contudo, seguem os especilistas outorgando-lhes genialides, qualidades linguísticas-intelectuais excelentes. Meu avô diria: “Vão lamber sabão! – “Pentear macaco!”
Uma das coisas que me impressionou aqui foi ver como os que se apresentam como cultores da forma não costumam ser tão rigorosos e corretos quanto apregoam. Quanto mais o sujeito fetichiza a forma, quanto mais ele faz questão do difícil, mais ele dá umas deslizadas que comprometem o seu texto… me incomoda muito o internetês ou essa linguagem de SMS. Mas também me incomomodam formalismos bocós. Tive exposição demais ao bacharelismo vazio para poder aceitar isso…