“Cem anos de solidão” é um monumento cravado na história da literatura, ponto. Como os três ou quatro principais livros que o escritor colombiano publicou depois dele mantêm o sarrafo lá no alto, o solo sob seus pés parece firme. A reputação que falta fixar é a do homem público, a do “político”, papel que o ex-menino pobre e franzino de Aracataca passou a representar de modo praticamente profissional depois de se consolidar como celebridade planetária com o Nobel de literatura de 1982. A vaidade transoceânica era um dos lados menos favoráveis do baixinho Gabo. É óbvio o prazer que ele sentia no papel de mediador universal: o escritor no labirinto de sua própria influência, sob o peso de uma fama achachapante, brincando de resolver os problemas do mundo.(Leia mais.)
Eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1993 e vencedor do Prêmio Camões em 2008, o escritor baiano era “imortal” apenas no título honorífico. Seu principal romance, “Viva o povo brasileiro”, é imortal literalmente. Épico da nacionalidade, com sua narrativa espalhada por quatro séculos de história e amarrada com o fio mítico, lírico, cômico e irreverente da reencarnação dos personagens segundo a compreendem as religiões afro-brasileiras, esse romanção é provavelmente a última – e brilhante – tentativa feita por nossa literatura de dar conta do país como um todo, respondendo artisticamente à pergunta que instigou os grandes intérpretes do Brasil no século XX: o que vem a ser este país enorme, ao mesmo tempo fascinante e infantiloide, generoso e cruel? (Leia mais.)
Não é fácil dar conta da sensação – que é sobretudo de um certo vazio, mas eu não estaria exagerando se acrescentasse à mistura notas de luto e desamparo – provocada pela morte de Ariano Suassuna. O homem era ultraconservador, mas desconfio que andei errado ao supor que o “Romance d’A Pedra do Reino”, um dos maiores romances brasileiros do século XX, fosse uma obra-prima apesar do ideário estético de seu autor. No oceano de geleia que é a cultura globalizada contemporânea, a perda de Suassuna – e de João Ubaldo – torna o Brasil indiscutivelmente mais burro, mais amorfo e mais desgovernado. Nosso lastro cultural não é tão grande assim para que a gente o saia dispensando de forma perdulária. (Leia mais.)
Um comentário
Faltou na lista o saudoso Rubem Alves.