Nenhuma outra experiência de aliar imagem e texto foi tão contundente na literatura brasileira quanto a de Valêncio Xavier. O autor de O Mez da Grippe (1981) e de várias outras histórias morreu às 11h30 da manhã desta sexta-feira (5) devido a complicações ligadas a uma pneumonia. Ele tinha 75 anos e passou 82 dias internado no Hospital São Lucas, mais da metade deles na Unidade de Tratamento Intensivo.
Notícia da “Gazeta do Povo”, de Curitiba, que pode ser lida na íntegra aqui. Curitibano nascido em São Paulo, Valêncio Xavier Niculitcheff era um desses escritores radicais para quem o texto linear seria uma camisa-de-força. Mais – ou menos – que um experimentalista, era um brincalhão, um Homo ludens atraído tanto pelo trágico quanto pelo cômico. Quando descobri aquelas charmosas fotos antigas que W.G. Sebald mistura à sua ficção, a primeira coisa que pensei foi: “Já vi isso em algum lugar, mas era diferente”.
Sim, era diferente: as fotos vinham ao lado de reclames antigos de jornal e velhos postais na literatura fragmentada de Valêncio Xavier. Para quem ainda não o conhece, uma boa porta de entrada é a bela edição que reúne “Minha mãe morrendo” e “O menino mentido”, lançada em 2001 pela Companhia das Letras. Ou o já mais difícil de encontrar “O mez da grippe e outros livros”, na reedição da mesma editora, de 1998, que deu ao autor projeção nacional. Quando o Luís Henrique Pellanda do “Rascunho” me deu a notícia, agora há pouco, me veio imediatamente à cabeça a linda dedicatória no fim de “Minha mãe morrendo”:
Este livro é dedicado ao menino que morreu.
12 Comentários
não
morrer aos 75 é uma benção ; depois disto é uma graça. fique com DEUS.
Famoso quem?
autor original…e domentario adima ignorante!!
autor original e comentario acima ignorante!!
Eu o conheci quando morava em Curitiba, foi no no 1976, me interessava por cinema, Valêncio era diretor da Cinemateca Guido Viaro. Deu opotunidade para muitos jovens talentos e cedeu espaço para que os amantes do Super 8 se reunissem aos sabados na Cinemateca naquele ano. Era uma pessoa muito respeitada, um intelectual admirável.
O mez da gripe foi recentemente mostrado no filme Mystérios, produzido pela WG7 BR, de Gil e Mônica, protagonizado por Carlos Verezza, muito interessante e gerando muitos comentários. Nota-se que Valêncio Xavier era muito bom.
Dele li o crimes a moda antiga. Bom. Ou Faraco bebeu dele ou vice versa. Enfim, pneumonia eh uma m… Deve estar numa boa agora. Os livros ficam.
Sérgio:
acompanhava a literatura do Valêncio desde quando ele publicava os livros por conta própria, nos anos 70, 80. Tentei levá-lo para uma editora decente, na virada dos 80 para os 90. Achava-o (acho-o) um gênio. A editora nem quis saber: aquilo não ia vender mais que cem exemplares para os amigos. Engoli minha frustração. Acho que ele não me acompanhou no sabor amargo desse sapo, ocupado decerto com novas imagens, estruturas, um novo livro. Quando finalmente uma editora decente apostou nele, a Cia. das Letras ( talvez a partir, e não só, claro, de ele ter sido capa da “Ilustrada” da FOLHA DE S. PAULO por conta exatamente dessa condição de ser um gênio sem editor), com O MEZ DA GRIPPE, no qual me pôs uma dedicatória – olha eu aí me exibindo; porém, como não me exibir? –, “Pro P. B., com amor. Do Valêncio, 98”, e em seguida vieram mais dois (MINHA MÃE MORRENDO E O MENINO MENTIDO, 2001, e RREMEMBRANÇAS DA MENINA DE RUA MORTA NUA E OUTROS LIVROS, 2006, acabou fatalmente veiculado formalmente na melhor mídia cultural. Alguma crítica, como a de Flora Süssekind, encorajou-se a lê-lo/vê-lo. Mas suas tiragens não pagavam o custo, provavelmente. Não tenho prognósticos, evidentemente, ainda mais em se tratando desse desero que é a literatura de qualidade num “mercado” como o brasileiro. Mas há uns dois meses aconselhei uma estudante de importante universidade a fazer sua tese sobre a obra de Valêncio Xavier. Parece que não seria a primeira. A uqestão, objetiva, sem dupla pieguice, é que a devida lágrima já tinha caído antes, quando ele nasceu no Brasil. Azarado Valêncio!
Teu site tá du caralho, Sérgio!
Valeu, Bentancur! Bom vê-lo por aqui, um abraço.
O V.X. é mestre total. Conheci em 98, quando o Mez da Grippe foi reeditado pela Cia das Letras. Farol criativo, a obra dele é uma espiadela do que pode ser a literatura no futuro próximo. O Umberto Eco (Misteriosa Chama da Raina Loana), por exemplo, levou uma vida inteira para chegar onde o Valêncio esteve desde os 80. Só quero ver o ASSOMBRO que vai gerar quando começarem a abrir as gavetas do menino mentido.
Aproveito o momento e ofereço minha contribuição para a recepção crítica do V.X. Quem quiser saber mais sobre a obra do Xavier, pode encontrar no endereço abaixo um ensaio monográfico que escrevi em 2007 sobre o “Mez da Grippe” e “Minha Mãe Morrendo e o Menino Mentido”.
http://www.4shared.com/file/74879079/ba9690eb/milton_colonetti_at_cubanos.htm
Lembro-me de ficar fascinado por Donald Barthelme, nos anos 70, pela mistura que fazia de notícia com ficção, ilustração com texto, tipologias diversas numa mesma história (Vida de cidade, editado pela Artenova).
Nos anos 80, quando conheci Valêncio Xavier (O Mez da Grippe), vi que era mais radical que o americano, indo muito além. Um verdadeiro inventor.