Clique para visitar a página do escritor.

Viva a tuiteratura: do concurso ao lado ao festival mundial

03/12/2012

"Doze pássaros", de M.C. Escher

O blog vizinho “Veja Meus Livros” está recebendo até o próximo dia 9 inscrições para um concurso de microcontos no formato Twitter, em parceria com a editora Globo. Os vencedores receberão como prêmio uma pequena montanha de livros. O desafio é resumir, em até 140 caracteres, a saga de Sherazade, a contadora de histórias das “Mil e uma noites”. Tarefa dura: na verbosidade obrigatória da moça que noite após noite entretinha o sultão com suas narrativas para não morrer, 140 caracteres dariam conta de uns poucos segundos. Estarei entre os jurados.

O microconto ultrassintético continua sendo, a meu ver, o maior desafio de quem pretende usar o Twitter para fazer ficção. É estranho que tenha sido um gênero definitivamente menor – com trocadilho, claro – no primeiro festival de ficção do Twitter, que durou cinco dias e terminou ontem. Há mais Sherazades do que Daltons no mundo.

O Twitter Fiction Festival teve um grande e indiscutível mérito: reunir gente de todo o planeta em torno da hashtag #twitterfiction. O clima – exagerado, como é comum nesses casos – era de urgência e fervor. “A literatura nunca mais será a mesma depois disso”, chegou a dizer alguém. O que é cômico, claro. A maioria dos ficcionistas-tuiteiros deu preferência a narrativas mais ou menos compridas fatiadas numa série de tuítes, em detrimento do conto de tiro único.

Não há nada de errado com o modelo serial. Ele foi usado com sucesso por Jennifer Egan em seu conto ou novelinha “Caixa preta”, publicado em maio deste ano no perfil da revista “New Yorker” e mais tarde lançado em livro (no Brasil, pela Intrínseca). Pena que pouca gente no festival tenha mostrado preocupação em incorporar a limitação de espaço ao próprio tecido da trama, como fez Egan. O nível médio do trabalho de linguagem também foi baixo. Houve quem quebrasse frases no meio, com reticências, para retomá-las no tuíte seguinte.

Parece evidente que, se novas formas de narrar surgirão nesse meio (não duvido), não será pelo caminho de simplesmente enfiar ali uma história já existente, como um esquartejador fazendo a mala.

De positivo, houve algumas experiências engenhosas com interatividade, como a da americana Elliot Holt, que começa com a morte de uma mulher que despenca do terraço de um hotel de Nova York durante uma festa. O leitor é apresentado então ao que tuitaram naquela noite três dos convivas e convidado a votar por meio de uma hashtag em “assassinato”, “suicídio” ou “acidente”. A premissa é ótima e o resultado, bastante curioso. Ganhou “assassinato”, mas essa é apenas a preferência do público. A história não se fecha. O conjunto da obra pode ser lido (em inglês) aqui.

Para mim, o festival foi sobretudo uma oportunidade de cruzar fronteiras e atingir novos leitores – possibilidade que também é uma característica marcante do meio, ao lado da concisão e do potencial interativo. Em inglês, joguei na tuitosfera a série “História do mundo em 13 tuítes”, que já saiu aqui, e uma dezena de historinhas-de-um-tuíte-só escritas para a ocasião. Todas estão disponíveis no meu perfil (público) @sergiotodoprosa. A que fez mais sucesso foi esta:

He was born, grew up, loved a little, got old, and just before dying realized with dismay that his life fitted into a tweet.

Tradução:

Nasceu, cresceu, amou um pouquinho, envelheceu, e logo antes de morrer se deu conta, desolado, que sua vida cabia num tuíte.

Saldo: ganhei seguidores em lugares tão improváveis e heterogêneos quanto Dubai, Dallas, Cidade do Cabo, Lima, Bangalore e Tirana. Recomendo.

Nenhum Comentário

Os comentários estão fechados.