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Kafka, um escritor realista
Posts / 03/04/2007

Esse anti-sensacionalismo do tom, o não-anúncio do incomum, confere ao incomum, até mesmo ao pavoroso, um bem-estar pequeno-burguês muito característico. Esse produto misto de horror e conforto perdeu, hoje, certamente, a estranheza que, a seus primeiros leitores, dera a impressão de loucura. Todos nós estamos a par dos “aposentos sociais” que os chefes de campos de extermínio mobiliaram com estofados, vitrolas e quebra-luzes, parede-meia com as câmaras de gás. A sala de estar de K., no ginásio de esportes de O castelo, não é em nada mais fantástica do que esses cômodos contíguos às câmaras de gás, os quais, sem dúvida, pareciam normais a seus usuários. Esse cruzamento “louco” (“desloucado”) de ambientes, empreendido por Kafka, é, na verdade, uma descrição da realidade; uma descrição do fato de que, hoje em dia, o “mundo dos deveres” e o “mundo familiar privado” mal têm algo a ver um com o outro, ainda que se instalem sob o mesmo teto ou, pelo menos, se interseccionem como mundo único. Na realidade, o exterminador industrializado e o jovial pai de família são um único e mesmo homem. Mas, uma vez que a total discrepância entre as “esferas da vida” é considerada natural, do ponto de…