O escritor e crítico literário irlandês John Banville, 61 anos, é quase um desconhecido do público brasileiro. O que não chega a ser surpresa: ele também não goza lá de grande fama entre os leitores anglófonos. Considerado um autor “difícil” por sua prosa poeticamente trabalhada e pelo ritmo lento de suas narrativas, Banville nunca teve vendas além de uns poucos milhares de exemplares – tiragem de ficcionista brasileiro – até ganhar o Booker Prize de 2005, e com ele uma avalanche de manchetes, por este “O mar” (Nova Fronteira, tradução de Maria Helena Rouanet, 224 páginas, R$ 29,90). O romance é narrado de forma não linear por um crítico de arte de meia-idade que, tentando se recuperar da morte da mulher, retorna à cidadezinha praiana onde passava férias na infância e mergulha num mar de memórias dolorosas. A maior parte da crítica internacional saudou o livro como a obra-prima de Banville, e os elogios, embora eu ainda esteja no início da leitura, me parecem fundados. Do autor eu só tinha lido o interessante “O livro das provas”, lançado aqui pela Record em 2002. “O mar” promete mais. A beleza hipnótica de sua prosa, conservada pela tradução, brilha no trecho abaixo,…
“Onde estou?”, disse Billy Pilgrim. “Preso numa outra bolha de âmbar, Sr. Pilgrim. Estamos onde temos que estar exatamente agora – a trezentos milhões de milhas da Terra, em direção a uma curva de tempo que nos levará a Tralfamador em questão de horas, em vez de séculos.” “Como – como eu cheguei aqui?” “Só um outro terráqueo poderia lhe explicar isso. Os terráqueos são os grandes explicadores, explicam por que este evento é estruturado da forma que é, dizem como outros eventos podem ser obtidos ou evitados. Eu, que sou um tralfamadoriano, vejo o tempo como um todo, da mesma forma que você veria um trecho das Montanhas Rochosas. Todo o tempo é todo o tempo. Não muda. Não se presta a alertas ou explicações. Simplesmente é. Observe-o momento a momento e descobrirá que nós todos somos, como eu disse antes, insetos no âmbar.” “Para mim, você soa como se não acreditasse no livre-arbítrio”, disse Billy Pilgrim. Comecei a reler Slaughterhouse-Five ontem à noite (“Matadouro 5” no Brasil; a L&PM tem uma edição de bolso baratinha, com boa tradução de Cássia Zanon). Dei boas risadas, feliz – e um pouco surpreso – de constatar que o livro não envelheceu…