Esbarro duas vezes no mesmo dia com Anton Tchekhov (1860-1904), o grande dramaturgo e contista russo. No “Globo”, Ana Paula Sousa conta que o criador de “Tio Vânia” e “As três irmãs” é o autor mais montado da cena teatral londrina este ano. E na revista “The New Criterion”, um alentado artigo (em inglês) de Gary Saul Morson enfatiza as peculiaridades que o tornavam um escritor único no panorama da literatura russa – e não só dela. Nem aristocrata, nem radical, Tchekhov escrevia em tom menor. Era um médico de província que privilegiava as cenas banais sobre os quadros extravagantes e a atenção ao detalhe comezinho em detrimento de projetos grandiosos e teorias abrangentes. Abstrações o desagradavam. É autor de um dos melhores conselhos a escritores que eu conheço: “Não diga que a lua está brilhando. Mostre-me seu reflexo num caco de vidro”. Não tinha nenhuma proposta política a apresentar aos seus leitores porque considerava ser o dever de um grande artista reconhecer que ninguém entende nada do mundo. Covardia? Essa impressão se desfaz quando se sabe o quanto ele teve que brigar para defender tal postura. Ocorre que a personalidade de Tchekhov não o tornava um escritor esquisitão apenas…
É imperdível este artigo que Enrique Vila-Matas publicou no “Babelia” em fevereiro deste ano – e que eu quase perdi. Resgatei-o por acaso, e como não se trata de matéria que envelheça tão facilmente, compartilho aqui o relato mordaz sobre a polêmica entre dois gigantes das artes do século 20, o escritor alemão Thomas Mann e o compositor austríaco Arnold Schoenberg, com o auxílio luxuoso de Theodor Adorno no papel de intermediário. Segue um breve resumo da confusão, que espero que funcione como isca e não como substituto da leitura do texto em espanhol. Ao escrever, já em seu exílio americano, o romance “Doutor Fausto”, que lançaria em 1947, Mann sentiu que esbarrava nos limites de seus conhecimentos musicais. Estes não eram pequenos, mas ele precisava dar ao personagem do compositor Adrian Leverkühn a capacidade de voos mais altos, fazer dele um revolucionário pensador da música. Em seu socorro veio um solícito Adorno, compatriota mais jovem – apresentado como “adulador, quase servil, admirador ardente” de Mann – que tratou de lhe fornecer competentes resumos das teorias de Schoenberg, o criador do dodecafonismo. Pois bem: o escritor teria enxertado então em seu romance esses resumos, sem mudar quase nada – algo…
Cervantes morreu em 22 de abril de 1616. Shakespeare o acompanhou um dia depois, 23 de abril de 1616. Sterne R.I.P. em 18 de março de 1768. No século seguinte, também em março, dia 22, do ano de 1832: Goethe. Flaubert tinha então dez anos, e 58 ao parar de envelhecer, em 8 de maio de 1880. Machado foi fazer companhia a Brás Cubas no dia 29 de setembro de 1908. Mais dois anos e Tolstoi perdeu a guerra, tomara que para encontrar a paz: 20 de novembro de 1910. Em 3 de junho de 1924 foi a vez de Kafka sair da vida, mas aquilo era vida? Joyce começava então a escrever o Finnegans Wake. Em 13 de janeiro de 1941, levou-o a peritonite. Rosa completou sua travessia de homem humano em 19 de novembro de 1967, três dias depois de virar imortal. Em 1977, Nabokov se foi em 2 de julho e Clarice em 9 de dezembro, no pós-parto de Macabéa, um dia antes de completar 57. Conclusão: escrever é tão perigoso quanto viver. E eu mesmo não estou me sentindo muito bem.
Nos estudos literários, e não só neles, as “humanidades digitais” têm sido um dos campos mais cheios de energia inovadora dos últimos anos. No instigante “A literatura vista de longe”, lançado no Brasil pela Arquipélago Editorial em 2008, o crítico italiano Franco Moretti, um dos pioneiros da área, aplica à história da literatura técnicas de análise quantitativa que até então sentiam-se mais confortáveis nas ciências exatas. Em vez do close reading, da leitura atenta, por que não compreender o fenômeno das letras por meio de uma leitura feita deliberadamente por alto, à distância, em busca de padrões? Hoje a ocorrência de uma palavra ou conceito pode ser mensurada em segundos dentro da obra de um ou vários autores, de um ou mais países, de uma época, ao longo da história. Estamos falando, claro, de mais um subproduto cultural da revolução digital, promovida no caso pelo tsunami de digitalização e indexação de livros iniciado por um pequeno tremor de terra ocorrido nos laboratórios do Google em 2002. Em um ensaio publicado no “Los Angeles Review of Books”, o escritor e crítico canadense Stephen Marche conta essa história e, sem apelar para o saudosismo, especula sobre os limites de seu alcance. Traduzo…
Aqui vai mais uma historinha didática. Tem dois caras sentados num bar nas profundezas remotas do Alasca. Um dos caras é religioso, o outro é ateu, e eles estão discutindo a existência de Deus com aquela intensidade característica que surge lá pela quarta cerveja. Aí o ateu diz: “Olha, não é que me faltem motivos concretos para não acreditar em Deus. Não é como se eu nunca tivesse experimentado essas coisa toda de Deus e orações. Agora mesmo no mês passado eu estava longe do acampamento quando fui pego de surpresa por aquela nevasca terrível, não conseguia ver nada, fiquei totalmente perdido, estava 45 graus abaixo de zero, e aí decidi fazer exatamente isso: caí de joelhos na neve e gritei ‘Oh Deus, se é que existe Deus, estou perdido nessa nevasca e vou morrer se você não me ajudar!”. Aí o sujeito religioso encara o ateu, todo intrigado: “Bem, depois disso você deve ter começado a acreditar”, ele diz, “afinal de contas você está aqui, vivo”. O ateu revira os olhos, como se o religioso fosse um tremendo paspalho: “Não, cara, só aconteceu que uns esquimós apareceram do nada e me mostraram para que lado ficava o acampamento”. É…
“Viva o povo brasileiro”, obra-prima de João Ubaldo Ribeiro publicada em 1984, venceu a eleição que promovi em 2007 aqui no Todoprosa, perguntando a 50 escritores, críticos e editores qual era o mais importante título da ficção brasileira nos últimos 25 anos. Na época, apresentei esse romanção de 674 páginas como “épico mítico e irreverente da nacionalidade, com seu painel histórico abrangendo quatro séculos”, e não vejo motivo para alterar nenhuma palavra da sumária descrição. Naturalmente, uma obra tão vasta não transcorre num único registro, mas talvez não haja passagem que condense tão bem seu efeito geral quanto a famosa cena de uma batalha da Guerra do Paraguai, ocorrida no dia 24 de maio de 1866, da qual reproduzo o trecho abaixo. Os brasileiros – entre eles muitos baianos, e notadamente os filhos da ilha de Itaparica – estão levando a pior naquela terra “onde não há orixás, mas outras entidades, monstros de cabeça de boi e corpo de serpente com rabo de navalha”. Morrendo aos magotes, despertam a piedade dos orixás a que foram consagrados. Um a um, vão entrando na guerra Oxóssi, Xangô e Iansã. Ogum, porém, aquele que seria mais valioso, guerreiro invencível, se recusa a ajudar….
Em um belo trabalho de Paulo Werneck e Raquel Cozer, a “Folha de S.Paulo” revela hoje a identidade do “jurado C”, que com suas notas esdrúxulas decidiu sozinho os três vencedores do prêmio Jabuti de romance. Trata-se, segundo o jornal, do crítico literário Rodrigo Gurgel, colaborador do jornal “Rascunho” e autor do recém-lançado “Muita retórica – pouca literatura” (Vide). A manipulação do resultado ocorrida na fase final, em que suas notas extremas transformaram em peças nulas as avaliações dos colegas de júri, não seria tudo. O jornal sustenta que o jurado – aparentemente determinado a explorar a polissemia da palavra – contrariou os juízos que ele próprio emitira na primeira fase do julgamento: o livro de Wilson Bueno ganhou dele média 8,67 na etapa eliminatória e 0,33 na final; o de Luciana Hidalgo caiu de 9 para 0,83. Em seu blog, está no ar neste momento uma entrevista em que Gurgel faz uma lista dos críticos literários que admira: “Samuel Johnson, Charles Moeller, Northrop Frye, Edmund Wilson, Lionel Trilling, Joseph Pearce e Marcel Reich-Ranicki. Entre os brasileiros, gosto de Álvaro Lins, Augusto Meyer, Lúcia Miguel-Pereira, Temístocles Linhares, Wilson Martins e, mais recentes, Alexandre Eulalio, João Alexandre Barbosa, Marisa Lajolo, Alcir…
Nu na banheira, encarando o abismo (um manifesto sobre o fim da literatura e dos manifestos) é o prolixo título de um ensaio apocalíptico de Lars Iyer publicado no 12º número da revista “serrote”, que chega às livrarias semana que vem. Trata-se aparentemente de mais um aborrecido atestado de óbito da literatura, como aqueles que críticos sem conta vêm emitindo – para um departamento onde logo lhe carimbam “arquive-se” – há pelo menos um século. No entanto, o ensaio de Iyer se destaca da produção habitual dos apocalípticos por dois motivos. O primeiro é que é bem argumentado e bem escrito, com paixão e verve, característica respeitada pela tradução de Thiago Lins e que só um verdadeiro amante de literatura (um necrófilo, segundo o argumento do autor) poderia lograr. O segundo motivo é mais interessante ainda: sendo também ficcionista – é professor de filosofia numa universidade inglesa e autor de dois romances – Iyer acaba deixando claro, na parte final do texto, que discute consigo mesmo. Sua preocupação principal é identificar aquilo que ainda pode ser escrito após a suposta morte da literatura, uma vez que, evidentemente, escrever continua sendo preciso, não apenas para ele como para muitos de nós….
Desta vez o prêmio Jabuti exagerou: a zebra que representou a vitória do estreante Oscar Nakasato na categoria romance, com “Nihonjin” (Benvirá), nem chegou a se impor como o que poderia ser – uma aposta corajosa e estimulante num autor novo, não apenas distante da glória oficial, mas praticamente desconhecido. Essa leitura otimista do resultado anunciado ontem em São Paulo foi imediatamente comprometida pelo fato de que Nakasato venceu graças à traquinagem de um único jurado – identificado por enquanto como “jurado C” – que o cumulou de notas 10 ao mesmo tempo que dedicava aos demais concorrentes uma chuva de notas entre zero (!) e 1,5. Algo semelhante ao que fez nos anos 1980 uma jurada do desfile das escolas de samba do Rio, decretando a vitória da Mocidade Independente. O nome disso é manipulação de resultado. A má fé explícita do “jurado C” – cuja identidade, de acordo com o regulamento, só pode ser revelada após a entrega das estatuetas, dia 28 de novembro – avacalha de vez um prêmio que vem se avacalhando nos últimos anos, emaranhado em escolhas discutíveis, regulamento trapalhão e uma incontrolável metástase de categorias (hoje são 29, com três prêmios para cada uma)…
A crítica jornalística, já disse Antonio Candido, é uma atividade de alto risco. Avaliar com pressa e no calor da hora os méritos de uma obra literária, emitindo juízos que a posteridade terá tempo de sobra para julgar, confirmar ou revogar, é andar na corda bamba. Elogios rasgados a livros medíocres costumam ser esquecidos, mas o oposto disso, o pau firme em obras que depois se revelam imortais, garante uma ridícula espécie de imortalidade aos resenhistas míopes. A Flavorwire, sempre ela, preparou uma saborosa lista (em inglês) de 15 críticas especialmente negativas colhidas por grandes obras da literatura na época de seu lançamento. Traduzi minhas preferidas: SOBRE LOLITA, DE VLADIMIR NABOKOV: “‘Lolita’ é inegavelmente uma novidade no mundo dos livros. Infelizmente, uma novidade ruim. Há duas razões igualmente sérias para que o livro não mereça a atenção de nenhum leitor adulto. A primeira é que ele é chato, chato, chato de um modo pretensioso, floreado e vazio. O segundo é que ele é repulsivo.” Orville Prescott, The New York Times. SOBRE ‘O MORRO DOS VENTOS UIVANTES’, DE EMILY BRONTË: “Como pode um ser humano ter escrito um livro como esse sem cometer suicídio antes de completar uma dúzia de capítulos…
O bastão de país homenageado da Feira do Livro de Frankfurt foi passado ontem, no encerramento da festa, pela representante da Nova Zelândia a Galeno Amorim, presidente da Biblioteca Nacional (foto), em cerimônia despojada. O vídeo completo, de uma hora e meia, pode ser visto aqui por quem estiver muito interessado (aviso que os primeiros minutos estão sem som). O escritor amazonense Milton Hatoum falou brevemente em nome da literatura brasileira, exaltando a antropofagia oswaldiana, depois de ler um trecho de seu romance “Dois irmãos”. Disse que o evento do ano que vem é a chance de “reparar uma grande injustiça, pois o boom da literatura latino-americana foi um boom da literatura hispano-americana”. Um pouco mais tarde, Arthur Nestrovski e Celso Sim apresentaram uma seleta de canções brasileiras em clima extremamente cool, só voz e violão. Um verso mais sincopado de Chico Buarque acabou engolido (antropofagicamente?) por Sim, mas poucos da babélica plateia devem ter notado. O resto do show de bolso correu com bom gosto e sem sobressalto. Sem sobressalto, mas também sem colorido e até com uma certa solenidade – no mesmo tom do vídeo oficial que a delegação brasileira preparou (veja abaixo) e em contraste marcante com…
O chinês Mo Yan, que ganhou hoje o Nobel de Literatura, aparecia em todas as listas de favoritos – na preferência dos apostadores da casa londrina Ladbrokes, estava em quarto lugar –, mas isso não quer dizer que sua obra seja fartamente conhecida no Ocidente. Como quase todo mundo, saí correndo atrás de informações sobre o homem, que não tem nenhum livro lançado no Brasil e que, na loja do Kindle, conta com apenas um título (em pré-venda!). As notícias da premiação (aqui e aqui) e o comentário de Maria Carolina Maia no vizinho “Veja Meus Livros” satisfazem a maior parte da curiosidade que se possa ter sobre o homem, uma escolha que tem inegável dimensão política, daquelas que o Nobel gosta de fazer. A partir do pseudônimo que adotou para escrever, e que significa “Não fale”, Mo Yan mantém relações tensas com o mundo oficial de seu país, onde a liberdade de expressão é restrita. A Academia Sueca o saudou por seu “realismo alucinatório” e o comparou a William Faulkner e Gabriel García Márquez. A melhor forma de conhecer um escritor, porém, é lê-lo. Por isso decidi traduzir o trecho inicial do romance Life and death are wearing me…
O mundo britânico das apostas, que tem na Ladbrokes seu principal palácio, não entende nada de literatura. Mesmo assim, todo ano movimenta fortunas às vésperas do prêmio Nobel de literatura, que será anunciado amanhã. Os jogadores da Ladbrokes, vindos virtualmente dos quatro cantos do mundo, não precisam ter lido um único livro do japonês Haruki Murakami (foto) para levá-lo ao topo da lista de favoritos – que é, confortavelmente, sua posição atual, depois que arrefeceu o ímpeto do azarão Bob Dylan. Os apostadores apostam em tudo o que for possível apostar, de corridas de cachorros a quem será o próximo arcebispo de Canterbury. Bastam rumores, palpites que por alguma razão soem mais convincentes do que outros, suposições de informação privilegiada. Não costuma dar certo: a Academia Sueca é competente em garantir que o resultado do prêmio nunca vaze e quase sempre surpreenda – para o bem e para o mal. Isso não se deve ao fato de os clientes da Ladbrokes não entenderem de literatura. Gente profundamente enfronhada no meio não se sai melhor nessa hora. Prêmios culturais têm mais em comum com jogos de azar do que seus promotores gostariam de admitir. De qualquer modo, o ranking de escritores…
Prêmios domésticos anunciados, Feira de Frankfurt à beira de começar, Nobel de literatura marcado para esta quinta, para mim não houve notícia literária mais importante enquanto eu estava de férias do que a morte, dia 30 de setembro, aos 86 anos, do escritor mineiro Autran Dourado. O autor de livros como “A barca dos homens”, “Ópera dos mortos” e “O risco do bordado” andava meio esquecido faz tempo. Como disse em um afetuoso artigo no último Sabático o crítico Silviano Santiago, que há alguns anos acompanhou o vencedor do Prêmio Camões de 2000 numa viagem a Sintra: “Pouco reconhecido no Brasil, Autran era recebido em Portugal com as honras merecidas”. O merecimento não se discute: trata-se (verbo no presente, pois certas coisas não morrem tão facilmente) de um romancista de peso, como não há de sobra na literatura brasileira. Sob a temática mineira interiorana que hoje corre o risco de parecer antiquada aos olhos de um país maciçamente urbano, havia um leitor crítico de clássicos e modernos e um ficcionista que refletia com lucidez sobre o seu ofício. Por isso, o livro que escolho para destacar aqui como homenagem póstuma não é um de seus romances, que li décadas atrás,…
Sérgio Rodrigues está de férias. A coluna volta a ser atualizada no dia 8 de outubro.
Fiquei muito feliz com a notícia (em inglês) de que o escritor americano Elmore Leonard, 86 anos, autor de um punhado dos melhores romances policiais e de faroeste de todos os tempos, vai receber a medalha da National Book Foundation pelo conjunto da obra, uma honraria que costuma ser abiscoitada por escritores mais “sérios” como John Updike, Gore Vidal e Toni Morrison. Além disso, a Library of America reunirá seus policiais em três volumes de capa dura. Pode ser que esses passos no sentido da canonização não signifiquem muita coisa para o ex-publicitário recluso que vive há décadas de seus livros, produzidos ao ritmo de um por ano e em muitos casos adaptados para o cinema e a TV. (Fala-se muito em “Jackie Brown”, um Tarantino menor, mas meu Leonard cinematográfico preferido é Get Shorty/“O nome do jogo”, de Barry Sonnelfeld.) Estamos falando de um sujeito avesso a qualquer tipo de pose, que projeta uma imagem de artesão e que nunca precisou reivindicar o título de “intelectual” para se levar a sério. De todo modo, as homenagens de agora não são propriamente uma surpresa. Elmore Leonard virou uma instituição cultural americana, ganhou elogios públicos de ninguém menos que Saul Bellow…
Eu me descobri envolvido em algo que se pode chamar de evento histórico mundial. Pode-se dizer que foi um grande evento político e intelectual do nosso tempo, até mesmo um evento moral. Não a fatwa, mas a batalha contra o Islã radical, da qual essa foi apenas uma refrega. Têm sido levantados certos argumentos, até por pessoas de orientação liberal, que me parecem muito perigosos. Argumentos que são basicamente de relativismo cultural: nós temos que deixá-los fazer isso porque é a cultura deles. Minha visão é: não. Circuncisão de mulheres – isso é uma coisa ruim. Matar pessoas porque você não gosta das ideias delas – isso é uma coisa ruim. Nós temos que ser capazes de ter um sentido de certo e errado que não se dilua nesse tipo de argumento relativista. Se não tivermos, teremos deixado de viver num universo moral. Em entrevista ao “New York Times”, concedida no mês passado mas publicada ontem, Salman Rushdie tocou com lucidez nos pontos que tornam “Joseph Anton” (Companhia das Letras, tradução de José Rubens Siqueira e Donaldson M. Garschagen, 616 páginas, R$ 54,50) – seu livro de memórias sobre a década que passou escondido sob o codinome inspirado em Joseph…