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Avellar encontra Bergman aqui em casa

30/07/2007

avellar.jpgCorte, montagem, simultaneidade, monólogo interior. A literatura teria inventado o cinema sem se dar conta disso? E depois, conscientemente, teria se voltado para o que inventou para se reinventar (escrevendo adaptações literárias de filmes)? Para deslocar seu ponto de vista para a sudação interior dos rostos?

Ou o cinema inventou-se a si mesmo? Fez-se a si mesmo, tal como a literatura, a poesia, a música, a pintura? E se assim foi (a invenção continuando a se inventar), as artes no século XX inventaram com o cinema novas formas de percepção do espaço e do tempo? Ou, como propõe Carlos Fuentes, apenas desenvolveram outros instrumentos para prosseguir “la pugna del arte desde el Renacimiento”?

A notícia da morte do cineasta sueco Ingmar Bergman (leia mais no blog irmão do Calil, aqui) me pega às voltas com as provocações do crítico cinematográfico José Carlos Avellar – um dos ídolos da minha geração aspirante a uma vaguinha no jornalismo cultural, lá se vai um quarto de século – no recém-lançado “O chão da palavra – cinema e literatura no Brasil” (Rocco, 438 páginas, R$ 48,50).

Além de ser leitura recomendada a todos os interessados em literatura, cinema ou ambos, o livro também deve agradar a quem não se dedica a nenhuma dessas artes em especial, mas sabe apreciar ensaios inteligentes que insistem em sondar as profundezas de tudo aquilo que a cultura contemporânea, com estranha volúpia, garante ser mais superficial e chapado que propaganda de cerveja.

O que o genial Bergman tem a ver com isso? Tudo. Inclusive o fato de não me ocorrer, assim de estalo, um exemplo de cineasta mais literário e cinematográfico ao mesmo tempo.

20 Comentários

  • Jonas 30/07/2007em16:16

    Pois é, como também escrevi, o Bergman tinha questionamentos metafísicos muito próximos da literatura e da filosofia. Uma grande perda.

  • Marcelo Moutinho 30/07/2007em16:29

    Esse livro está em catálogo, Sérgio?

  • Camila 30/07/2007em16:42

    Curiosamente, ontem me lembrei de Bergman enquanto via o anti-Bergman – Seinfeld. Saudades das piores e das melhores sensações que Bergman me proporcionou – todo aquele sangue de Gritos e Sussurros, toda aquela estrada de Morangos Silvestres. Belo post, Sérgio.

  • C. Soares 30/07/2007em16:47

    “Corte, montagem, simultaneidade, monólogo interior. A literatura teria inventado o cinema sem se dar conta disso?” Ambos são representações da consciência. Oliver Sacks, o neurologista e autor, escreveu um artigo magistral sobre o tema, intitulado “In the River of Consciousness”.

  • Sérgio Rodrigues 30/07/2007em17:02

    Marcelo, o livro acabou de sair.

  • ishak 30/07/2007em17:09

    fico feliz que tenhas gostado, dom. alguma crítica?
    imagino o quanto não tá sendo brabo pro teu lado essa história do mínimo fora do ar..
    mas continua-se.
    vamos nos falando.
    abraço

  • Bemveja 30/07/2007em17:17

    R.I.P. Ingmar Bergman, um daqueles gênios raríssimos que produziu muito. Do ponto de vista literário, era mais ligado à dramaturgia.

  • pérsia 30/07/2007em17:51

    Cinema e literatura se recriam e uma a outra.

    ‘Gritos e sussuros’ me ensinou que há erostismo sem sexo, e erotização nos afetos.
    E tem filme mais solar que “Fanny e Alexander”?
    Era um poeta, sobretudo.

  • Luciene 31/07/2007em00:46

    Cineasta literário e cinematográfico? Tarkovsky.

    A notícia da morte de Bergman me deu uma suprpresa triste essa manhã. Mas a sensação posterior foi de carinho. Ele morreu em casa, aparentemente uma morte tranquila. deixou uma obra maravilhosa, produzida até o último momento. Fico feliz por ele.

  • Mr. WRITER 31/07/2007em00:56

    Xeque-mate…
    obrigado pelos filmes…

  • Silvio... Silva 31/07/2007em07:37

    obrigado pelos filmes… [2]

  • C. Soares 31/07/2007em11:39

    pelo comentário de Welles, a vida dele não deve ter sido muito fácil, não? pelo menos hoje, se quisesse, poderia configurar o computador para “bater palmas” para ele…

  • joao gomes 31/07/2007em11:53

    Nao me recordo de ter visto algum filme dele, mas prometo no futuro, se conseguir, ver alguns destes ai mencionados pelo povo que esta sempre inside of cult.

    Repórteres mencionaram o filme “O Sétimo selo” como algo muito impressivo. Uma partida de xadrez com a Morte, salvo engano. Talvez valha realmente a pena ver.

    Espero que respeitem minha confissao.

  • joao gomes 31/07/2007em12:14

    E o Antonioni hem?? Fará Falta?

  • Mindingo 31/07/2007em13:46

    Puta merda, no mesmo dia se vão Bergman e Antonioni. Os outros bons, como o Kubrick, já se pirulitaram faz tempo. Vamos ter de ficar com os Piratas do Caribe pra sempre?

  • Jonas 31/07/2007em15:12

    Se continuarmos nesse ritmo, vai ser Rohmer na quarta, Resnais na quinta e Godard na sexta.

  • Cezar Santos 31/07/2007em15:31

    Bergman, Antonioni… infelizmente, a indesejada das gentes não perdoa genialidades. E pensando bem, é bom que seja assim mesmo. Cada um tem ou cria o tempo que pode para dar seu recado ou não dar recado nenhum, o que também não é nenhum demérito.
    Bergman e Antonioni são exemplos de criadores que não contemporizavam com o público. Sem serem pedantes ou obscuros, faziam seus trabalhos de acordo com aquilo que imaginavam e com os meios que dispunham. Quem quisesse que se virasse pra “entender”…
    São exemplos de honestidade intelectual.

  • LuizFernandoGallego 01/08/2007em00:32

    Este livro do Avellar, eu ainda nem sabia que existia, mas o que esse cara escrevia nos áureos tempos do Caderno B da melhor fase do JB era de se babar: o melhor crítico de cinema do Brasil, escreve bem e não se comprometia com o “gostei” ou “não gostei”, apenas oferecia modos de se aproximar dos filmes, botando o leitor para pensar. E escrevia muito bem sobre Bergman, dentre outros grandes autores que já se foram.

  • Daniel Brazil 05/08/2007em18:31

    Cineasta literário e cinematográfico? James Ivory, com toda a ponta e circunstância que um certo tipo de literatura pressupõe. Ou Nelson Pereira dos Santos…
    Há momentos de Bergman que são puro cinema, e é isso que o tornou grande.

  • Vera Sandroni 17/01/2009em06:56

    Não concordo com o literário e cinematográfico ao mesmo tempo. As artes não se misturam. Apenas há uma certa preguiça de análise mais profunda dos generos e suas possibilidades nos diversos meios. Vera