O modismo da juventude foi muito conveniente para jovens como eu, que fizeram dele seu ganha-pão, mas acho que está na hora da crítica adotar algum parâmetro mais significativo. O escritor inglês Evelyn Waugh escreveu essa frase em 1932, quando, beirando os 30 e já em seu terceiro livro, via-se como um ex-enfant terrible das letras britânicas. Poderia estar falando do Brasil dos últimos anos. Muita gente na literatura nacional – e nos arredores, sobretudo nos arredores – andou ocupada recentemente com o velho mito do jovem gênio, também conhecido, em sua encarnação 2.0, como escritor-blogueiro. Na falta de um mercado leitor significativo para a ficção escrita no país, criou-se uma espécie de bolha de marketing em que, uns por ingenuidade, outros por esperteza, parte da imprensa e da crítica empenhou-se em vender aos leitores uma mistura maluca de continente e conteúdo. De repente, dois únicos critérios pareciam nortear a busca de relevância literária: a idade (pouca) e a virtualidade (enorme). Bastava ler com olhos livres para perceber que, como é natural, raros daqueles nomes justificavam o burburinho. Não se revoga por decreto a severidade da relação ancestral entre quantidade e qualidade na arte. Acontece que olhos livres são mercadoria…
Os leitores deste blog já sabiam da novela. Agora ela chega oficialmente ao fim – e se isso não for motivo para gritar “parem as máquinas!”, não sei o que será. Trinta e um anos depois de sua morte, Vladimir Nabokov está lançando livro novo. Dmitri, seu filho, levou todo esse tempo para decidir contrariar o último desejo do pai, que queria ver o manuscrito queimado, e publicar, mesmo inacabado, o romance The original of Laura. Ingenuidade deste blogueiro? Por que não tratar o caso como mais um episódio daquela oportunista e interminável série “Os baús”? Bom, há algumas razões. Primeiro, Nabokov foi, acima de qualquer dúvida, um dos maiores escritores do século 20. Segundo, consta que ele apostava alto nesse livro. Terceiro, era um perfeccionista que trabalhava o texto num nível de acabamento tão estratosférico que seu primeiro rascunho tem tudo para ser mais polido que a maioria das versões finais que circulam por aí. E em quarto lugar – bom, não tem quarto lugar. A não ser, talvez, a resposta que Dmitri, 73 anos, deu em sua entrevista de ontem ao “New York Times” (em inglês, cadastro gratuito), quando lhe perguntaram se a principal motivação para sua decisão…
O vidro martelado da porta tem um letreiro em tinta preta trincada: “Philip Marlowe…. Investigações”. É uma porta razoavelmente decadente no fim de um corredor razoavelmente decadente, num edificio do tipo que era novo ali pelo ano em que o banheiro com azulejo até o teto se tornou a base da civilização. A porta fica trancada, mas ao lado dela há uma outra, com letreiro igual, que não fica. Pode entrar – não há ninguém aqui além de mim e de uma enorme mosca varejeira. Mas não se você for de Manhattan, Kansas. O início de “A irmãzinha” (The little sister, The Library of America, tradução caseira), de Raymond Chandler, o grande estilista da literatura policial americana hard boiled, já devia ser inesquecível quando foi publicado pela primeira vez, em 1949. Ainda mais inesquecível se tornou, porém, depois que milhares de escritores mundo afora fizeram questão de lembrá-lo, lembrá-lo e lembrá-lo de novo, numa avalanche de imitações, sátiras, pastiches, glosas e homenagens que encheriam bibliotecas. Um processo de lugar-comunização tão avassalador que, a esta altura, estará desculpado quem preferir esquecer o inesquecível. É estranho pensar que nunca mais será possível ler esse parágrafo sem ouvir os ecos de suas palavras…
No “Rascunho” de março, o bom escritor Rubem Mauro Machado, autor, entre outros livros, do premiado mas pouco conhecido romance “A idade da paixão”, investia contra a mistura de despreparo e descaso do jornalismo cultural brasileiro para lidar com o crescente volume de livros de autores nacionais: Vamos ser bem sinceros: a grande mídia (embora ela não possa ou não ouse confessar isso abertamente) está se lixando para a cultura brasileira e, dentro dela, especialmente para a literatura brasileira. (…) E no entanto é importante que se proclame: avaliar a obra de um autor brasileiro não é um favor que se faz a ele – é um direito legítimo que ele tem, do mesmo modo que o público tem todo o direito de saber que existe essa obra na qual ele poderá se refletir, ou não; o leitor deve ter acesso à informação, embasada e isenta, para decidir. Como os suplementos se transformaram em larga medida numa ação entre amigos (“você me elogia, depois retribuo”) ou numa extensão dos departamentos de mídia das editoras, a reproduzir releases, quase toda crítica que trazem vem hoje eivada de suspeição. Pode ser verdade, mas, como costuma ocorrer, não toda a verdade. Quem se…
Sobre “Como falar dos livros que não lemos?”, do francês Pierre Bayard (Objetiva): Faz diferença enfrentar Ulisses, algo que vai nos consumir meses ou anos, se o que “importa” é saber sobre o que o texto trata, qual sua relevância, quais foram suas inovações de linguagem, que lugar ele ocupa na história da literatura? Se tais perguntas fossem realmente a sério, uma crítica inevitável a Como falar… seria a de que seu autor esquece aquilo que move a maioria dos leitores. Ou seja, o prazer, o medo, o impacto, o encantamento e todas as sensações que tiramos de um livro em si, concomitantemente à sua fruição, o que é imediato e anterior a qualquer elaboração intelectual. É isso o que ficou para mim, por exemplo, dos romances de mistério da Coleção Amarela que li pelos 12 ou 13 anos, dos quais é difícil lembrar até os títulos. Ou dos gibis de terror da editora Vecchi. Ou de centenas de histórias de Tio Patinhas, Bolinha e Marvel que deixaram a infância gloriosamente autista e colorida. Mas Bayard está longe de ser tão óbvio. Mais que uma tese, seu livro é um exemplar acabado de prosa irônica, que usa um cinismo falso…
Existe uma cidade, uma cidade belíssima, que está indo para as cucuias. Mas, coisa curiosa, a literatura que nela se produz não parece muito interessada em refletir isso. Consciência do próprio caráter de artifício, alergia a temas que possam ser considerados políticos, esteticismo, cinismo ou apenas vocação para outros tipos de olhar, o fato é que a maioria dos escritores do Rio (e eu me incluo aí) tem adotado um certo ar blasê enquanto o velho espírito carioca estrebucha na calçada. Como se, sei lá, precisássemos fingir que é dor a dor que deveras sentimos. Fernando Molica é uma exceção. Sendo também jornalista, e dos bons, há anos se ocupa de traduzir os signos mais vistosos dessa queda, que na imprensa são rasos e febris, ruído puro, para a linguagem saturada de sentido da literatura. Correndo os riscos embutidos em seu projeto – inclusive o de ser visto como herdeiro do populismo literário de um José Louzeiro, coisa que não é –, divide sua fé em doses iguais entre realidade e ficção, sem fazer caso excessivo da desconfiança que nossa época devota a ambas. A sobriedade desse olhar realista mas bem-humorado, que repudia esquemas absolutos e tramas mirabolantes, é uma…
Edições do tipo “baú do fulano”, que raspam as gavetas de defuntos ilustres para faturar uns cobres a mais, não costumam ter muita serventia – a menos que você seja um fã roxo, do tipo que compraria no eBay um lenço de papel usado por fulano, caso em que o “baú do fulano” é uma delícia. Mas toda regra tem exceção. A julgar por esse artigo de Steve Almond na revista eletrônica “Salon” (em inglês, acesso livre), o livro Armageddon in retrospect, coletânea póstuma de escritos de Kurt Vonnegut, dá ao leitor o raro vislumbre do momento em que um grande escritor encontra sua voz – mais especificamente a voz inconfundível, mordaz e cara-de-pau que conduz “Matadouro 5”. É nas cartas escritas para a família quando estava na Europa, lutando na Segunda Guerra, que Vonnegut soa mais parecido com o narrador de sua futura obra-prima, e não nos primeiros contos realistas e sérios que produziu após voltar para casa, determinado a se tornar escritor profissional. Não deixa de ser uma lição para jovens (ou nem tão jovens) escritores que estejam à procura desse tesouro fugidio chamado “voz própria”: depois de muito procurar, experimente ficar distraído.
Começa com uma criança que nunca foi adulta e acaba com um adulto que nunca foi criança. Algo parecido. Ou melhor: começa com um suicídio adulto e uma morte infantil e acaba com uma morte infantil e um suicídio adulto. Ou com várias mortes e vários suicídios em idades variáveis. Não tenho certeza. Não tem importância. Como se sabe – se desculpa e se perdoa –, os números, os nomes, os rostos costumam ser os primeiros a se atirar do navio ou a saltar da plataforma durante o naufrágio dessa memória sempre a ponto de ser aniquilada sobre os trilhos do passado. Uma coisa está clara: no fim do começo, no começo do fim, Peter Pan morre. Assim começa o romance “Jardins de Kensington” (Conrad, 2007, tradução de Sérgio Molina), do escritor argentino – radicado na Espanha – Rodrigo Fresán. O narrador é um escritor fictício, Peter Hook, mistura de herói e vilão a partir do nome em que se fundem Peter Pan e o Capitão Gancho. Hook, uma cria dos anos 60, alimenta uma obsessão por J.M. Barrie, autor da famosa fantasia vitoriana, e despeja seu drama sobre um ouvinte menino em condições peculiares. A história intrincada e maluquete…
Um capítulo decisivo dessas relações transnacionais foi a consagração de García Lorca em Buenos Aires, em 1932, não evitando, porém, que Jorge Luis Borges o antagonizasse e chamasse de “andaluz profissional”. Borges, por sua vez, freqüentava grupos literários argentinos de vanguarda, influenciados por Darío. Na ocasião, Lorca acolhia Neruda, que reconheceria a importância desse encontro em sua Ode a García Lorca. Neruda, por sua vez, hostilizava César Vallejo, acusando ainda Vicente Huidobro de contribuir para essa ruptura. No início da guerra civil espanhola, emergia para a vida literária Octavio Paz, em um momento em que se confundiam criação e resistência antifascista. Por conta de divergências na organização de uma antologia de autores hispano-americanos, Paz e Neruda acabariam pegando-se em um banquete (o registro desse e outros episódios, em Sombras de Obras de Paz). Uma geração de espanhóis influenciada por um nicaragüense; o poeta de maior prestígio dessa geração hostilizado por um argentino, o que não o impediu de fascinar a um chileno rompido com um peruano, em um ambiente literário que logo receberia a um mexicano. Tais episódios podem parecer um registro menor, da petite histoire. Mas a série de aproximações e afastamentos entre poetas de diferentes países, porém da…
Mas se toda a obra de Steinbeck está em catálogo quarenta anos depois de sua morte (em 1968), e apesar da dieta forçada de seus livros imposta a centenas de milhares de estudantes – e da canonização oficial pela Library of America –, por que será que ele está tão decisivamente excluído do mapa literário? Além de Brad Leithauser, que em 1989 publicou uma perspicaz homenagem ao qüinquagésimo aniversário de “As vinhas da ira”, quem nos Estados Unidos o leva a sério hoje, com exceção de meia dúzia de acadêmicos steinbeckianos e alguns entusiastas locais em Monterey? O duro artigo de Robert Gottlieb em “The New York Review of Books” (via Arts & Letters Daily), a propósito da conclusão, pela Library of America, da “consagradora” edição da obra de John Steinbeck, me deixou aqui pensando se algum escritor brasileiro estaria em papel semelhante – ao mesmo tempo literariamente morto e respirando por aparelhos nos currículos escolares. Alguém disse José de Alencar? Tá legal, passa no mínimo perto. Só não vou assinar embaixo com entusiasmo irrestrito por reconhecer meu fraco kitsch e quase lacrimejante por aquela prosa poética de Iracema, “Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia…
Não sei se o sobrenome tem algo a ver com isso, mas vira e mexe eu preciso tomar a bênção do Nelson. Começou quando publiquei em 2000, no livro “O homem que matou o escritor”, um conto chamado O argumento de Caim, que tem o cara como personagem. O primeiro conto do meu primeiro livro, que bandeira. Angústia da influência? Não, prefiro influência da angústia. Ou só brincadeira, como nesta crônica escrita de encomenda semana passada: . O político sobe ao palco com solene lentidão, acompanhado da mulher. Uma saraivada de flashes torna a cena estroboscópica. Ele pára diante da tribuna de madeira maciça, dá duas pancadinhas para testar o microfone, pigarreia e diz: – Bom dia. Tive experiências extraconjugais. Traí minha mulher e não me orgulho disso. Minha mulher também me traiu. Mas nunca gastamos um centavo de dinheiro público para nosso deleite pessoal. O bordel de high school girls foi pago com meu salário suado, Madame Luba Jones está aí para comprovar. Venho confessar tudo de público antes que… Um murmúrio percorre a platéia composta de dezenas de jornalistas. Bloquinhos, gravadores e câmeras ondulam como um mar revolto. – Quem traiu primeiro? – grita uma moça ruiva na…
Fundir literatura e internet – uma fusão profunda que use as ferramentas digitais para revolucionar o próprio modo de narrar e não apenas para divulgar textos lineares – é, para muita gente, uma obsessão. É possível que esse caminho acabe levando cedo ou tarde a uma obra-prima. Embora eu não consiga ver o texto-texto se tornando obsoleto, nada impede que novas formas de contar histórias ganhem vida própria, sem precisar tomar o lugar das já existentes. O certo é que as freqüentes tentativas de acelerar essa fusão in vitro têm sido, na melhor das hipóteses, esforçadas. A última é um projeto inglês chamado We tell stories (Nós contamos histórias), patrocinado pela Penguin. Seis jovens escritores foram convidados a criar, ajudados por programadores de games, “web-histórias” inspiradas em livros tradicionais. A primeira experiência já está no ar: assinada por Charles Cumming, chama-se The 21 steps e se baseia no livro “Os 39 degraus”, de John Buchan, que Hitchcock transformou num filme homônimo de 1935. Se eu gostei? Longe disso: achei canhestro, tatibitate e colossalmente chato. É claro que novas formas de narrar criam novos tipos de leitores e, bem, eu jamais serei um deles. Mesmo assim The 21 steps deixa a…
…quando se trata dos textos canônicos da moderna ficção científica, e da assombrosa geração de proféticos inovadores formada por seus contemporâneos – Isaac Asimov, Robert A. Heinlein e Ray Bradbury – os escritos do Sr. Clarke eram os mais bíblicos, os mais prontos a amplificar a razão com a convicção mística, os mais religiosos no sentido mais amplo da religião: especular sobre começos e fins, e como fazemos para ir de uns aos outros. Demoro um pouco a saber o que fazer dessa observação de Edward Rothstein em seu artigo sobre Arthur C. Clarke (1917-2008) no “New York Times” (em inglês, acesso gratuito). Passada a surpresa inicial, ela me ajuda a acertar contas com minha própria admiração adolescente – esquecida por décadas, mas essas coisas não morrem – por um escritor cujas fabulações me pareciam, naquele tempo, infinitamente superiores ao lirismo piegas de Bradbury e ao vale-tudo imaginoso, mas meio tosco, de Asimov. Paro por aqui as comparações, reconhecendo os limites estreitos de minha erudição no gênero. No meu caso, a paixão pela FC arrefeceu com a idade adulta, e o que dela restou já tinha migrado para as graphic novels quando chegou a vez de minha própria geração revolucionar…
Entrou no ar neste fim de semana o site da segunda edição da Copa de Literatura Brasileira. Como um dos jurados deste ano, tive direito a voto, mas nem por isso me considero suspeito para elogiar a lista dos dezesseis concorrentes, que me parece sensata, eclética e representativa. Não faltará quem torça o nariz, alegando que a literatura brasileira não produz dezesseis bons romances por ano. Concordo. Mas o que importa é que os livros realmente relevantes estão lá. E se a Copa for tão divertida quanto a do ano passado, terá valido a pena. * Muito bom o texto do crítico Alcir Pécora na “Folha” de sábado (só para assinantes) sobre o livro de contos “Putas assassinas” (Companhia das Letras), de Roberto Bolaño: De repente, percebe-se que a paisagem é de horror, na iminência tensa de um desastre. A natureza do desastre é potencializada na injustiça e crueldade da América Latina, acumulada sobre um fundo primitivo de traição, dor e vingança. A violência contra mulheres, índios, velhos e crianças são evidências da devastação em curso, mas não é para os políticos que Bolaño aponta em primeiro lugar o dedo acusador, e sim para a cumplicidade que a literatura estabelece…
Lendo o Babelia (em espanhol, acesso gratuito), encontro uma reveladora entrevista de Ian McEwan: “Muitos acreditam que o romance perfeito é ‘Madame Bovary’. Eu o reli há dois anos e pensei: não é. ‘Madame Bovary’ morreu. (…) Dizem que quando Emma morre, Flaubert chorou. Agora entendo por que não gosto. Ele estava envolvido demais com a história. Deveria ter permanecido muito mais frio, distante, com algo de gelo”. Meu susto nada tem a ver com a frieza que o escritor inglês confessa. Mais prosaico, deve-se ao fato de que só agora On Chesil Beach está chegando ao efervescente mercado editorial espanhol, oito longos meses depois de dar as caras por aqui. A propósito: para McEwan, o romance que mais se aproxima da perfeição é “Ana Karenina”. * Lendo o Prosa & Verso (só para assinantes), o susto é com as seguintes palavras do jornalista José Castello sobre a novelinha “A morte e a morte de Quincas Berro D’Água”, de Jorge Amado: “jóia até hoje desprezada que, lançada seis anos antes de ‘Cem anos de solidão’, de Gabriel García Márquez, antecipa o realismo mágico”. Hein? Promovido abruptamente de maior nome da “escola” que se costuma chamar de realismo mágico a seu…
– Ele está fotografando há três anos, dá só uma olhada no trabalho – disse Maurice. – Aqui, esse cara. Repara na pose, na expressão. Quem ele te lembra? – Parece um pilantra – disse a mulher. – Ele é um pilantra, o cara é um cafetão. Mas não é disso que eu estou falando. Aqui, essa. Dançarina de cabaré nos bastidores. Te lembra alguém? – A garota? – Dá um tempo, Evelyn: a foto. A sensação que o cara captura. A garota tentando parecer adorável, exibindo a mercadoria, que aliás não é nada má. Mas repara no camarim, nas tralhas brilhosas todas, essa pobreza de papel laminado. – Você quer que eu diga Diane Arbus? – Eu quero que você diga Diane Arbus, isso seria bem legal. Eu quero que você diga Duane Michaels, Danny Lyon. Eu quero que você diga Winogrand, Lee Friedlander. Quer voltar alguns anos no tempo? Eu gostaria muito que você dissesse Walker Evans também. – Seu velho chapa. – Muito, muito tempo atrás. Antes até do seu tempo. Não sei por que o diálogo que abre “LaBrava”, de Elmore Leonard, que li há uns vinte anos, nunca me saiu da cabeça – nem todo…
É literário como poucos o Oscar deste domingo. Não apenas porque três dos cinco candidatos a melhor filme são baseados em romances, mas também – e principalmente – porque pelo menos dois deles são adaptações muito acima da média de livros excelentes. O “pelo menos dois” da frase anterior cumpre a função de evitar uma injustiça com “Sangue negro”, de Paul Thomas Anderson, baseado no livro Oil!, lançado em 1927 pelo escritor americano Upton Sinclair. Destes nada posso falar, nem livro nem filme, pois não vi um nem li o outro – o professor Bayard que me desculpe. Posso falar de “Desejo e reparação”, de Joe Wright, baseado no romance “Reparação” (Companhia das Letras), do inglês Ian McEwan, e de “Onde os fracos não têm vez”, adaptação feita pelos irmãos Coen do thriller “Onde os velhos não têm vez” (Alfaguara), do americano Cormac McCarthy. São dois belos e raros filmes, que bagunçam por completo aquela velha máxima – maldosa, mas freqüentemente aplicável – de que quanto melhor o livro, pior o filme e vice-versa. “Reparação” é forte candidato a grande romance deste início de século. O longa-metragem não chega perto disso, mas é notável como consegue ser fidelíssimo a um…