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Pequeno sertão
NoMínimo / 03/08/2007

— Mire veja: a senhora por demais não espera. Assunto pouco do meu querer. Informação que pergunto: passasse por aqui, deve de, um homem alto; sorridente, cidadoso? A senhora visse; visto? Homem como se alongado no entender das coisas, com ares de senhoroagem? A pois, a senhora diga: tendo ou não vendo, aonde foi? Para essas bandas ele mais que por onde veio; desconfio. A senhora tolere o meu perguntar; de susto, assusto. Careço ...

Não está com essa bola toda
NoMínimo / 02/08/2007

O escritor americano de ficção científica John Scalzi diz que “O apanhador no campo de centeio”, de J.D. Salinger, é seu livro superestimado de eleição. Chama o narrador, Holden Caulfield, de insufferable twit – acho que “paspalhão insuportável” é uma tradução decente. E daí? Bom, para saber se Scalzi tem alguma dose de razão eu teria que reler o livro de Salinger, que muito apreciei uns vinte anos atrás, mas con...

JT Leroy: martelo batido
NoMínimo / 01/08/2007

Quem se lembra da nota sobre o estranho caso JT Leroy, publicada aqui em junho, a propósito do julgamento da ação de fraude movida por uma produtora de cinema – que comprara os direitos sobre a obra do “autor” – contra a verdadeira escritora por trás do personagem, chamada Laura Albert? Só para não deixar pontas soltas: Albert foi condenada ontem a pagar US$ 350 mil à parte queixosa – mais aqui, em inglês, mediante cad...

Avellar encontra Bergman aqui em casa
NoMínimo / 30/07/2007

Corte, montagem, simultaneidade, monólogo interior. A literatura teria inventado o cinema sem se dar conta disso? E depois, conscientemente, teria se voltado para o que inventou para se reinventar (escrevendo adaptações literárias de filmes)? Para deslocar seu ponto de vista para a sudação interior dos rostos? Ou o cinema inventou-se a si mesmo? Fez-se a si mesmo, tal como a literatura, a poesia, a música, a pintura? E se assim f...

Jane Austen e o besteirol periódico
NoMínimo / 27/07/2007

Uma das maiores dificuldades de ir envelhecendo no jornalismo – meninos, eu vi! – é a inevitabilidade de uma descoberta que a princípio nos choca, mas em seguida vira matéria de tédio profundo: de tempos em tempos, a maior parte da imprensa acaba fazendo exatamente o que tinha feito algum tempo atrás. Igual. E não estamos falando apenas de “textos criativos” sobre a chegada do inverno. No jornalismo cultural, um tipo espec...

O problema é ‘o problema’
Sobrescritos / 25/07/2007

Qual é o maior problema da literatura brasileira? ( ) Os escritores não sabem escrever. ( ) Os leitores não sabem ler. ( ) Os críticos não sabem criticar. ( ) Os blogueiros se acham escritores. ( ) Os comentaristas de blog se acham críticos. ( ) Os críticos dos comentaristas de blog se acham. ( ) Os críticos dos comentaristas dos críticos dos comentaristas de blog… hã, onde estávamos mesmo? ( ) Ser brasileira demais. ( ...

Copa de Literatura Brasileira
NoMínimo / 24/07/2007

Um prêmio que se vende como capaz de escolher regularmente o melhor livro do ano não pode expor ao público nem os gostos dos seus jurados, nem as falhas do seu processo. Mas se a idéia é, como acredito que sempre seja, simplesmente falar de livros, por que não mostrar o processo por inteiro? Por que não dar voz e espaço a cada jurado para explicar sua escolha? E, se escolher o melhor é estatisticamente impossível, por que não...

Começos inesquecíveis: Daniela Abade

Foram os óculos de sol. Os meus começaram a se desmantelar depois que saí do carro e atravessei a rua para visitar um cliente – um pino se soltou e me vi obrigada a ficar de quatro no asfalto, juntando pedaços de armação. Os dele não existiam e foi exatamente a ausência dessa proteção que o cegou momentaneamente quando contornava a esquina com seu caminhão. Outras teorias, algumas mais científicas, outras mais supersticios...

Leonardo Sciascia: ‘A cada um o seu’
Primeira mão / 20/07/2007

O grande escritor siciliano Leonardo Sciascia (1921-1989) andava negligenciado pelas editoras brasileiras há alguns anos. Terá saído de moda a literatura engajada, sempre às voltas com temas políticos, de um escritor que acabaria mesmo se lançando na política partidária – inicialmente pelo PCI e depois pelo Partido Radical? É possível. Quantos leitores jovens saberão sequer que seu sobrenome é pronunciado Xaxa ? Seja como ...

Culposo?
Sobrescritos / 19/07/2007

O problema de Demóstenes Bastião era que ele escrevia em preto-e-branco. Não num preto-e-branco estiloso ou expressionista. Num preto-e-branco cinza, cinza-e-branco, cinza-e-cinza. Chiadeira das mais invernosas, sua prosa era mais cacete que a palavra “cacete” usada como adjetivo, mais morrinha que um daqueles lençóis de vapor que uma vez por década envelopam o mundo por semanas, meses, sem chover nem sair de cima, até os can...

Só rindo
NoMínimo / 18/07/2007

Corajoso é o experiente jornalista e semelhante meu, a nível de literato, Mario Sabino, chefe do crítico literário Jerônimo Teixeira, ao atrair para si, a nível de chefe de revista burra para consumidores médios de revistas nacionais que se julgam inteligentes, o ressentimento de seus semelhantes literatos, aos quais trata com desprezo monumental, com um grande desprendimento de vaidade, já que possui a coragem de assumir public...

Oz e a capacidade de imaginar o outro
NoMínimo / 17/07/2007

E não é que aquele mago quatro-olhos (veja a nota abaixo) ainda é capaz de conjurar boas discussões? Mas uma pergunta que pode ser respondida sem apelar para o gosto é: a diminuição de horas de leitura por prazer e o poder de atração dos grandes sucessos são mesmo um problema cultural grave? Se eu tivesse que responder agora, diria não. Grave é não saber ler, ser incapaz de decodificar um texto, mas cada vez menos pessoas s...

Potter, não-Potter, Potter, não-Potter…
Posts / 16/07/2007

Sim, eu sei: o assunto costuma render debates lamentáveis. Lixo para alguns, maravilha para outros, Harry Potter pode ser uma prova cabal do emburrecimento do mundo ou a melhor coisa que acontece para a popularização da leitura desde que Gutenberg inventou sua máquina sujona. Para quem tende a achar que a verdade imprime melhor em meios-tons, essa polêmica já soa vazia há alguns anos. Mais um motivo para ler o artigo (acesso livr...

Corrupção
A palavra é... / 13/07/2007

Antes de designar a venda ilegal de favores por representantes do poder público, corrupção é deterioração, decomposição física, apodrecimento. “Corrupto” vem do latim corruptus, particípio de “corromper”: é o corrompido, o podre, o que se deixou estragar. Como se vê, nossa linguagem condena a corrupção com uma veemência muito maior do que seria de esperar numa sociedade inclinada a pagar a cerveja do guarda sem pe...

Começos inesquecíveis: José Agrippino de Paula

Eu sobrevoava com o meu helicóptero os caminhões despejando areia no limite do imenso mar de gelatina verde. Sobrevoei a praia que estava sendo construída e o helicóptero passou sobre o caminhão de gasolina onde um negro experimentava o lança-chamas. Eu falei com o piloto do meu helicóptero apontando o caminhão de gasolina, e o helicóptero fez uma manobra sobre o caminhão-tanque e pousou alguns metros adiante. Eu saltei do hel...

A oficina baratinha de Ivan Ângelo
NoMínimo / 11/07/2007

Oficina literária de melhor custo/benefício eu não conheço: comprar num sebo (os preços, na Estante Virtual, começam em R$ 5) um exemplar do livro de contos “A face horrível”, do escritor mineiro Ivan Ângelo (Nova Fronteira, 1986), e ir direto às três últimas histórias, chamadas “Dénouement”, “Entrevero do autor com seu conto” e “Final”. As três histórias são, de certa forma, uma só. Eis a oficina. Conv...

Apontamentos: a Flip que eu pude ver
NoMínimo / 09/07/2007

Quando finalmente cheguei a Parati, era fim de tarde de sexta-feira e o trem já ia lá na frente, puxado por uma locomotiva desembestada chamada Will Self, com seu rastro fumegante de gozações agressivas com tudo e com todos, no geral e no particular – da própria literatura ao mediador de sua mesa, Arthur Dapieve, a quem terminou propondo galhofeiramente que tivessem um caso e fugissem para a Amazônia, onde se dedicariam ao espor...